Do ascenso de massas dos 80 ao próximo, que será ainda maior

Do ascenso de massas dos 80 ao próximo, que será ainda maior

As poderosas manifestações de 1980 e a volta da luta dos trabalhadores hoje em dia

O ascenso de massas dos anos de 1980 no Brasil, foi produto do acúmulo de contradições das décadas anteriores que acabaram estourando à luz da maior crise capitalista mundial após a Segunda Guerra Mundial, que estourou em 1974.

O chamado “Milagre Brasileiro” esteve na base da estabilidade da Ditadura Militar durante o governo Médici, que foi quem derrotou o ascenso de massas de 1968 e as guerrilhas esquerdistas. Eram recursos obtidos nos mercados financeiros internacionais a taxas de juros variáveis que foram aplicados em obras de infraestrutura fundamentalmente.

Quando as taxas de juros explodiram com a crise mundial de 1974, a dívida externa explodiu junto e a “bonança” viu o seu fim chegar.

Em 1970, a Arena, o partido da Ditadura Militar, arrasou nas eleições, sob o impacto dessa bonança e do Brasil Campeão da Copa do Mundo. O general Médici foi ovacionado no Estádio do Maracanã.

Em 1974, a Arena perdeu em quase todo lugar para o MDB (Movimento Democrático Brasileiro).

O cenário político continuou se deteriorando com a repressão escancarada. Os assassinatos de Zuzú Angel, do operário Manoel Filho e do diretor da TV Cultura Vladimir Herzog, foram marcantes.

A virada a partir do ascenso estudantil

No mês de maio de 1976, os estudantes da USP (Universidade de São Paulo) haviam criado o DCE (Diretório Central dos Estudantes) Livre Alexandre Vannucchi Leme, por fora da estrutura oficial da Ditadura. Nesse ano, foram realizados dois Encontros Nacionais de Estudantes, também desafiando a legislação da Ditadura, que começou a relaxar um pouco a repressão no governo do general Geisel.

Os estudantes da USP, da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo e da PUC do Rio estavam em greve desde o início do ano letivo, em protesto contra o corte de verbas para a educação e o aumento das anuidades e taxas.

Em março, aproximadamente dois mil estudantes da USP saíram em passeata desde o campus universitário até o largo de Pinheiros, marcando a retomada do movimento estudantil em todo o país, depois da derrota dos movimentos de 1968.

No dia 19 de maio de 1977, os estudantes celebraram um Dia Nacional de Luta em diversas universidades do país, exigindo o fim das prisões, dos atos de exceção, das leis repressivas e reclamando liberdades políticas e democracia.

Em Brasília, o Ato foi reprimido e resultou em punições aos participantes, e os estudantes responderam com uma greve exigindo que fossem anuladas.

A UnB (Universidade de Brasília) sofreu a terceira invasão. 

Em setembro, a PUC-SP foi ocupada pela polícia. 

Em agosto, foi recriada a União Estadual dos Estudantes (UEE), que havia sido tornada ilegal em novembro de 1964 pela Lei Suplicy. Em outros Estados, as UEE também foram recriadas e começou o movimento pela recriação da UNE (União Nacional dos Estudantes).

As grandes greves metalúrgicas

As greves metalúrgicas implicaram na entrada em cena do verdadeiro peso pesado da política, os trabalhadores de ponta.

A primeira greve importante estourou na Scania, em maio de 1978, no contexto da campanha que o Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo tinha impulsionado pela recuperação das perdas salariais de 1973, após o governo ter admitido a manipulação dos índices inflacionários, e que tinha sido inaugurada pela greve dos trabalhadores da Mercedes Benz no final de março.

A greve geral metalúrgica do ABC, começou a tomar forma a partir do dia 13 de março de 1979, às vésperas da posse do general João Figueiredo, quando os metalúrgicos do ABC entraram em greve.

No dia 15 de março, a greve foi julgada ilegal pelo TRT (Tribunal Superior do Trabalho), que também rejeitou a criação do delegado sindical, uma das principais reivindicações do movimento.

A Ditadura decretou a intervenção no Sindicato e a proibição de manifestações e assembleias no Estádio da Vila Euclides. 

Na assembleia geral realizada no dia 27 de março, após nova avaliação do Comando de Greve, chegou-se a um acordo provisório com os patrões, que Lula e o Comando levaram para aprovação nesta nova assembleia: os trabalhadores dariam uma trégua de 45 dias, período em que, através de novas negociações com os patrões, tentar-se-ia obter um índice salarial mais satisfatório do que aquele alcançado pelos metalúrgicos do interior; caso contrário, os metalúrgicos do ABC entrariam em greve novamente.

O Sindicato seguiu mobilizando os trabalhadores durante os 45 dias de trégua, preparando-se para um novo conflito. O descumprimento do acordo por parte dos patrões, com a realização de demissões e descontos nos salários dos trabalhadores grevistas, acabou por desencadear novas paralisações.[

No dia 12 de maio celebrou-se o acordo entre a FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) e os metalúrgicos do ABC, aprovado em assembleia no dia 13 de maio.

O acordo previa um aumento de 63% para aqueles que recebiam até dez salários mínimos. O índice seria aplicado sobre o salário de março de 1978 (acima de dez salários mínimos, o índice seria igual ao oficial, de 44%), tendo validade para as empresas que concederam o reajuste médio de 11% extradissídio no ano anterior.

Para os demais índices, seriam aplicados os mesmos do acordo realizado para os sindicatos do interior. Haveria, também, desconto de 50% dos dias paralisados.

A manobras realizadas pelo Sindicato dirigido por Lula priorizou a recuperação do Sindicato, ainda sob intervenção, que foi devolvido no dia 18 de maio de 1979.

Apesar do acordo ser mais vantajoso do que aquele assinado pela Federação, os trabalhadores o consideraram insatisfatório.

O repúdio à atuação da Diretoria foi tanta que o próprio Lula diria que teve medo de perder as eleições sindicais realizadas em 1980.

No dia 30 de março de 1980, os trabalhadores do ABC decidiram paralisar as atividades a partir de 1º de abril.

Em São Bernardo, a assembleia contou com sessenta mil operários; em Santo André, cerca de quarenta mil, e em São Caetano, no dia seguinte, dois mil operários tomaram a decisão.

A greve começou a ser levantada no dia 5 de maio, quando cerca de quinhentos operários de Santo André, reunidos em assembleia na Igreja do Bonfim, decidiram pelo encerramento da greve.

Naquele mesmo dia, em São Bernardo, ocorreu um acirrado confronto entre metalúrgicos e tropas policiais, estendendo-se por várias horas, após assembleia realizada pela manhã, na Igreja Matriz, ter decidido mais uma vez pela continuidade da greve. A Diretoria do Sindicato chegou a propor a mediação do general Figueiredo.

Os metalúrgicos do ABC puseram fim ao seu movimento grevista, no dia 12 de maio, após 41 dias paralisados. As lideranças sindicais permaneceram presas por mais alguns dias, quando um recurso apresentado pelo advogado do Comitê Brasileiro pela Anistia conseguiu o relaxamento da prisão preventiva. Os sindicalistas acabaram sendo processados com base na Lei de Segurança Nacional da Ditadura.

Em 22 de maio de 1980, dez dias após o término da greve, as empresas já haviam realizado cerca de quatro mil demissões.

Após essa derrota, começa um refluxo do movimento grevista que teve como base a nova política recessiva da Ditadura.

Delfim Neto e a política recessiva

Delfim Neto assumiu como super ministro do Planejamento, em 1979, acumulando responsabilidades que antes eram do Ministério da Fazenda.

A crise capitalista mundial avançava com o segundo choque do petróleo, provocado pela paralisação da produção no Irã em meio à revolução.

O Banco Central dos Estados Unidos, a Reserva Federal, aumentou os juros de 3% para mais de 20% para tentar conter a inflação no país. No Brasil, a dívida externa explodiu e a inflação deu lugar à hiperinflação.

A inflação anual passou de 200% em 1985 e a recessão tomou conta do país em quase toda a década de 1980.

A política recessiva do governo conseguiu conter o ascenso de massas durante quase dois anos, mas acabou estourando com ainda mais força.

O pico do ascenso de massas entre 1981-86

Entre 1981 e 1983, as oposições classistas que tinham se formado em todo o país conseguiram retomar dos pelegos vinculados à Ditadura, mais de 1.500 sindicatos, o que abriu caminho para a formação da CUT (Central Única dos Trabalhadores).

A CUT Pela Base, de cunho anarcosindicalista dirigiu a CUT Estadual de São Paulo até 1987 e disputou de perto o controle da CUT Nacional.

A Articulação lulista conseguiu manter o controle por meio da incorporação de uma grande quantidade de sindicatos rurais com direito a voto e por meio do refluxo do movimento provocado pelos planos Cruzeiro e Cruzado.

A primeira greve geral aconteceu no dia 21 de julho de 1983. O país se encontrava sob a condução da política econômica imposta pelo FMI (Fundo Monetário Internacional), com desemprego elevado, salários arrochados, inflação e taxas de juros em alta. A greve contou com a participação de mais de dois milhões de trabalhadores e estima-se que quarenta milhões de pessoas foram afetadas pela paralisação dos transportes.

Em 1985, foi fundado o MST (Movimento dos Trabalhadores Sem Terra) como produto do acirramento da luta de classes no campo.

Ainda em 1985, houve um pico de 15 mil greves, uma grande parte das quais foi muito radicalizada.

No dia 12 de dezembro de 1986, ocorreu uma nova greve geral, que teve como centro reivindicações econômicas, o fim das privatizações e o não pagamento da dívida externa. Era ainda um momento de crise econômica, com o fracasso dos planos econômicos do governo Sarney/PMDB (Cruzado I e II). Cerca de 25 milhões de pessoas aderiram ao movimento grevista, representando mais de 40% dos trabalhadores ativos. Outros milhões foram atingidos pela paralisação dos transportes.

O enfraquecimento do movimento de massas: 1987-95

Em 1987, a Articulação Sindical lulista conseguiu controlar a CUT de São Paulo e como produto dos planos de Sarney o movimento ficou controlado.

Nos dias 14 e 15 de março de 1989 ocorreu nova greve geral contra o plano econômico do governo, o Plano Verão, e reivindica o congelamento de preços, reposição das perdas salariais e fim do desemprego. Estima-se que a greve tenha atingido 35 milhões de trabalhadores e tenha mobilizado 70% da população economicamente ativa.

Com o governo Collor veio um novo choque econômico, numa primeira tentativa de impor as chamadas políticas “neoliberais”, que conseguiu controlar o movimento de massas.

Em 1988, a onda de privatizações começou a ser imposta na CSN (Companhia Siderúrgica Nacional), onde a resistência dos trabalhadores foi quebrada pela invasão do Exército que deixou um saldo de três trabalhadores mortos.

As duas últimas grandes greves metalúrgicas aconteceram em 1992, em São Paulo.

O enfraquecimento dos movimentos tinham como base a transferência de um número importante de plantas industriais às zonas especiais na China, onde os salários dos trabalhadores eram irrisórios, e a crescente inundação do mercado mundial com produtos chineses baratos.

Do choque FHC à contenção dos governo Lula

Os dois governos FHC conseguiram impor o chamado “neoliberalismo”, entregando uma boa parte do Brasil a troco de nada.

O movimento de massas foi controlado por meio do desmantelamento da economia nacional e com o apoio das burocracias sindical, do campo e estudantil, principalmente, que já tinham tomado corpo.

Nos governos FHC praticamente não houve nenhuma resistência enquanto o país era destruído.

A última grande greve no Brasil foi a greve dos petroleiros que aconteceu em 1995. Ela foi quebrada por meio da invasão das refinarias pelo Exército. O próprio Lula foi à TV para pedir aos grevistas voltarem ao trabalho porque as donas de casa estavam sem gás para cozinhar.

No início do ano 2001 começa a retomada do ascenso de massas sob o impacto das consequências das políticas aplicadas pelo governo FHC.

O ascenso foi controlado pelo governo Lula que cooptou as lideranças sindicais incorporando-as à máquina do estado, principalmente em cargos de chefia.

As direções dos movimentos sociais, como o MST e a UNE, se dedicaram a captar recursos públicos dos ministérios por meio de vários mecanismos.

Essa política teve um forte impacto sobre o movimento de massas.

Da Operação Lava Jato ao bolsonarismo

Os movimentos de 2013 foram contidos em grande medida pelo fascismo nas ruas, que posteriormente foi transformado em bolsonarismo, pela incorporação de alguns setores da esquerda, como o MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto), a essa política golpista e pela Operação Lava Jato.

Sob a ameaça da Operação Lava Jato, as direções dos sindicatos, dos movimentos sociais e dos partidos políticos ficaram imobilizadas, principalmente devido ao medo de serem presas. Até por um motivo muito simples; além da roubalheira generalizada devido ao atrelamento ao estado, é impossível no Brasil gerir um sindicato ou um partido político, por exemplo, totalmente dentro das normas legais, da mesma maneira que acontece com as pequenas empresas.

De 2017 até o final do governo Bolsonaro, as lutas foram fortemente contidas pelas burocracias. Tanto é assim que no período somente aconteceram duas únicas greves nacionais, na categoria dos trabalhadores dos Correios.

O governo Lula/Alckmin

O governo da “frente ampla”, encabeçado por Lula/ Alckmin, faz parte da política preferencial do imperialismo norte-americano de conter o movimento de massas por meio de governos esquerdistas super direitizados.

Os sindicatos e os principais movimentos de massas praticamente desapareceram de cena e se converteram em organismos cartoriais, da mesma maneira que aconteceu em boa parte da Ditadura.

Os trabalhadores e os setores oprimidos da população têm ficado assim sem os organismos de luta que foram construídos no ascenso do movimento.

Essa é a parte negativa da situação política, à qual se junta a política recessiva e a uberização, dentre outras questões.

O efeito colateral está em que os mecanismos sociais de contenção social ficaram muito debilitados.

A pressão da crise capitalista mundial pressiona fortemente os trabalhadores e as massas. O desemprego, a inflação e a carestia de vida avançam e a situação está tornando-se a cada dia mais insuportável.

O ascenso de massas da década de 1980 voltou a ser colocado em pauta, mas em este período tende a ser muito maior por causa da profundidade da crise capitalista, que é parte da crise de 2008 que ainda não se fechou.

Lenin disse que não há nada mais revolucionário que a inflação. Se a isto adicionarmos as demais mazelas sociais estamos perante um caldeirão de problemas que tende a continuar avançando rumo a um grande ascenso de massas.

O capitalismo não consegue resolver os problemas de maneira estrutural devido ao seu próprio funcionamento, às suas leis e contradições. A montanha crescente de capitais fictícios/ especulativos, por exemplo, não consegue ser limpa, o que seria uma condição para o funcionamento normal do capitalismo. Os lucros das grandes empresas dependem umbilicalmente deles. Isso conduz inevitavelmente a um grande estouro capitalista que provocará um grande ascenso de massas, muito maior que o da década de 1980.

A política guerrerista e de impulsionar o fascismo e o fechamento dos regimes também faz parte das tentativas da burguesia de manter o controle. A guerra e as políticas contrarrevolucionárias andam da mão do seu par, as revoltas populares e as revoluções.

É isso o que está colocado. Já temos um gostinho da Europa e em alguns países da América Latina, mas a situação tende a se generalizar.

Os agrupamentos revolucionários têm como obrigação orientar e fundir-se com o movimento de massas em ascenso.

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