«Jamais foi visto um caso em que mais de 100 jornalistas morreram cobrindo o genocídio em Gaza» – entrevista

«Jamais foi visto um caso em que mais de 100 jornalistas morreram cobrindo o genocídio em Gaza» – entrevista

Lucia Helena Issa é Jornalista, escritora e embaixadora da paz por uma organização Internacional.

Entrevista com Lúcia Helena Issa (*)

Por Mafra

(*) Lucia Helena Issa é Jornalista, escritora e embaixadora da paz por uma organização Internacional. Recebeu vários prêmios pelo seu trabalho nos campos de refugiados palestinos, entre eles, o Estrella del Sur, no Uruguai, e a medalha Marielle Franco, em Salvador. Atualmente é colunista do Monitor do Oriente, está terminando um livro sobre as mulheres palestinas, atualmente, Lucia vivendo entre o Rio de Janeiro e o Oriente Médio.

As narrativas enviesadas que são perpetuadas pela imprensa ocidental imperialista, particularmente dos Estados Unidos e da Europa, vêm moldando percepções distorcidas sobre o conflito entre Israel e Palestina. Com reportagens tendenciosas e omissão de fatos cruciais, a imprensa ocidental contribui para a perpetuação da ocupação israelense e a brutalização promovida contra o povo palestino. Essas falsas representações afetam profundamente a população local e seus refugiados, reforçando a desigualdade de poder e legitimando a violência perpetrada pelo Estado de Israel.

A manipulação da verdade pela imprensa ocidental imperialista tem sérias repercussões para a vida cotidiana dos palestinos. Essa distorção dificulta cada vez mais o reconhecimento da causa palestina e perpetua um ciclo de violência, intolerância e injustiça.

Além disso, essas mentiras da imprensa têm um impacto devastador no cenário internacional, minando os esforços pela paz e solidariedade com o povo palestino. Ao apresentar uma narrativa unilateral e injusta, os meios de comunicação influenciam políticas externas que favorecem o Estado fantoche de Israel em detrimento da soberania dos palestinos. Essa parcialidade fortalece a impunidade de Israel e perpetua a ocupação ilegal.

Diante desse panorama, é crucial desafiar e desmascarar as mentiras da imprensa ocidental imperialista, oferecendo uma plataforma para vozes palestinas autênticas e uma cobertura equilibrada do conflito. Somente através da divulgação da verdade e do apoio internacional verdadeiramente solidário é que a justiça e a paz poderão ser alcançadas na Palestina.

Por esse motivo, hoje trazemos uma especialista no assunto para esclarecer alguns pontos: 

Qual sua visão em relação à receptividade que o Brasil vem tendo em relação aos refugiados palestinos? O governo está dando algum auxílio?

Lucia: Eu acho que a gente avançou muito na questão da luta contra a intolerância, ódio religioso e a xenofobia. Mas nós ainda temos uma longa estrada pela frente. Nós vivemos alguns momentos muito tristes. Que testemunhei, no Rio de Janeiro como jornalista, já escrevi muito sobre isso, lutando muito contra a intolerância religiosa.

A gente teve, por exemplo, aquela chegada dos primeiros refugiados sírios dessa nossa era, você deve lembrar da agressão sofrida por Muhammad Ali, um refugiado sírio que nós depois ajudamos, ele comprou um food truck, foi maravilhoso, e hoje é um grande amigo meu e de várias pessoas que lutam contra o ódio religioso. Nesse episódio, Muhammad teve sua barraca de esfirras destruída e foi agredido por um miliciano lá no Rio de Janeiro.

Teve um outro episódio, também no Rio de Janeiro, de uma refugiada síria, Marian, que teve o seu véu rasgado por um evangélico extremista. A gente teve vários episódios, inclusive o daquela menininha que foi agredida no Rio por usar uma vestimenta branca da umbanda. 

Então eu acho que daquele momento de 10 anos atrás pra cá, principalmente depois da chegada do Lula ao governo, as coisas tem melhorado bastante. E também assim, são muitas palestras de várias pessoas no Brasil contra o ódio religioso, explicando o que as religiões têm em comum. 

Eu tenho a impressão que agora os palestinos estão sendo muito mais bem recebidos. Tem havido uma consciência muito maior de que Deus é um só, de que as religiões têm algo em comum, de que as religiões não propagam o ódio. São pessoas dessas religiões, os extremistas e alguns líderes de todas as religiões propagam o ódio e terrorismo. 

Sobre o terrorismo, a gente precisa lembrar que existe terrorismo cristão também. Nos Estados Unidos, os últimos atentados dos últimos 6 anos, vários atentados contra as minorias e imigrantes, foram todos promovidos pela extrema direita [cristã] , não por muçulmanos. 

Então eu acho que houve um avanço grande aqui no Brasil, mas ainda temos que conscientizar milhões de pessoas sobre a reconstrução da paz.

O que acha da postura do presidente Lula em relação à Israel?

Lucia: Eu acho que o presidente Lula está coberto de razão sobre o fato de que é um genocídio o que está acontecendo na Palestina.

A gente precisa lembrar que não é um genocídio que começou no dia 7 de outubro, mas que vem acontecendo desde 1948, quando Israel se autoproclamou um país sem esperar pela decisão da ONU; pois a resolução da ONU previa dois estados, um palestino e um para os judeus, lembrando que palestinos são muçulmanos e cristãos. 

A gente tem milhares e milhares de palestinos cristãos que foram apagados da grande mídia, e que também estão sendo massacrados por Israel. Cristãos como a grande maioria dos brasileiros, sendo mortos, torturados por serem palestinos e por habitarem naquela terra há pelo menos 7 séculos. 

O genocídio começou em 1948, e a palavra genocídio ela não se refere apenas a escala de mortes. Ele tem várias características, quando você tem mortes, sobretudo de mulheres e crianças, que representam o ventre e o futuro daquela nação. Quando uma guerra ou um conflito mira, sobretudo, mulheres e crianças, isso é claramente genocídio. 

Quando você tem um exército como Israel, que é um dos mais fortes e armados do mundo contra os palestinos que não possuem um exército, pois a Palestina não tem um exército oficial. Ela tem zero tanques, zero metralhadoras… A Palestina é proibida de ter um exército oficial. O Hamas não é um exército oficial, é um partido político com braço armado, qualquer grupo que você pegar na Palestina não é um exército. 

Eu entrevistei pessoas na Palestina, nas 6 vezes em que estive lá, inclusive do exército. O “exército” que existe lá é só humanitário, é só para tentar amenizar a fome, entregar comida, cobertores. A Palestina não tem exército, ela tem só um grupo de ajuda humanitária dentro do país. Então a gente vê um povo sem exército oficial atacado por um exército que é um dos mais violentos e armados do mundo, isso é genocídio. 

Hoje já é dito pelos maiores cientistas sociais do mundo, antropólogos e até o próprio Einstein comparou o holocausto dos judeus com o que estava acontecendo na Palestina na década de 50. 

Por qual motivo Israel impede os palestinos de saírem? 

Lucia: A faixa de Gaza é considerada a maior prisão a céu aberto justamente pois quem mora lá já é refugiado do Nakba (massacres de 1948) e dos massacres depois de 67, quando Israel expulsou e matou milhares de palestinos. 

Então assim, Gaza e outras cidades já são habitadas pelos refugiados desses massacres anteriores. A faixa é um lugar lindo, com vista pro mar, fértil sendo completamente destruída pois Israel quer anexar a faixa de Gaza para o seu território. 

É como se Israel quisesse anexar o Rio de Janeiro e aí falasse “ah, como tem alguns traficantes no Rio, a gente vai bombardear a cidade toda até encontrar os traficantes”, Será que a gente aceitaria isso? Aceitar que mais de 40.000 pessoas fossem mortas, desaparecidas e etc, sobretudo mulheres e crianças, porque existem grupos de traficantes e milicianos no Rio? É exatamente isso que Israel está fazendo. 

Então por qual motivo não permitem que os Palestinos saiam da faixa de Gaza? Primeiro que os que saíram no começo levaram informações, imagens e denunciaram para a ONU. Eles não permitem que os cidadãos de Gaza sequer tenham passaporte, mal têm documentos, pois eles não pertencem nem a Israel mas também não pertencem a uma Palestina oficial, muitos deles são apátridas. Muitos palestinos que encontrei em Beirute, Líbano, são apátridas por terem sido confinados a um campo de refugiados há mais de 70 anos.

Como está a situação dos jornalistas nas áreas de combate?

Lucia: Mesmo no Oriente Médio, que é uma área extremamente perigosa onde estive várias vezes, jamais foi visto um caso em que mais de 100 jornalistas morreram cobrindo o genocídio em Gaza. Isso jamais foi visto. 

Nos dias de hoje já são 103 jornalistas que morreram pelas mãos de Israel em Gaza, são 103 vozes que foram silenciadas pelo exército de Israel. Isso é gravíssimo, isso é crime! O exército de Israel é um dos mais imorais e que mais cometem crimes e ilegalidades contra a humanidade do mundo. Isso não aconteceu em nenhuma guerra anterior, isso tem que ser denunciado por todos nós.

Além disso, foram 12 mulheres jornalistas mortas e 91 homens. Isso também diz muito sobre o conflito, pois mesmo as mulheres jornalistas em Gaza sendo minoria, ainda foram 12 mulheres assassinadas. […] Israel sabe onde estão os prédios da imprensa, tanto que já atacaram o prédio da Al Jazeera, destruíram! Em 2018 já haviam atacado prédios da Reuters em Gaza. O exército ocupante deveria ser responsável pela segurança dos jornalistas, e é ao contrário. Em gaza, o exército que ocupa ilegalmente a Palestina é responsável pela morte de mais de 100 jornalistas

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