Pós modernismo, identitarismo e fascismo

Pós modernismo, identitarismo e fascismo

O que está em jogo não é a defesa ou não das lutas e dos movimentos de “minorias”, mas sim a forma de fazê-la.

A pós-modernidade é um conceito da sociologia histórica que designa a condição sócio-cultural e estética dominante no capitalismo após a queda do Muro de Berlim (1989), o colapso da União Soviética e a crise das ideologias nas sociedades ocidentais no final do século XX, com a dissolução da referência à razão como uma garantia de possibilidade de compreensão do mundo através de esquemas totalizantes . 

Algumas escolas de pensamento situam sua origem no alegado esgotamento do projeto moderno, que dominou a estética e a cultura até final do século XX. Em A Condição Pós-Moderna, François Lyotard caracteriza a pós-modernidade como uma decorrência da morte das «grandes narrativas» totalizantes, fundadas na crença no progresso e nos ideais iluministas de igualdade, liberdade e fraternidade.

Outros, porém, afirmam que a pós-modernidade seria apenas uma extensão da modernidade, período em que, segundo Benjamin, ocorre a perda da aura do objeto artístico em razão da sua reprodução técnica, em múltiplas formas: cinema, fotografia, vídeo, etc.   Lyotard ainda argumentou que várias metanarrativas de progresso, tais como a ciência positivista, o marxismo e o estruturalismo foram extintos como métodos de alcançar progresso

O conceito de pós-modernidade inclui, portanto, o que se designa como pós-modernismo em arte – especialmente na arquitetura.

O crítico brasileiro Mário Pedrosa foi um dos primeiros a utilizar este termo, em 1966. Em importante artigo sobre a arte de Hélio Oiticica, publicado no Correio da Manhã de 26 de junho de 1966, Pedrosa afirmava: 

´´Hoje, em que chegamos ao fim do que se chamou de arte moderna (…), os critérios de juízo para apreciação já não são os mesmos (…) fundados na experiência do cubismo. Estamos agora em outro ciclo, que não é mais puramente artístico, mas cultural, radicalmente diferente do anterior e iniciado, digamos, pela pop art. A esse novo ciclo de vocação antiarte, chamaria de arte pós-moderna. ´´

A partir das jornadas de 2013 no Brasil se percebe, um importante segmento social a se destacar nessa cena vem sendo aquele oriundo das camadas médias, a esquerda, em que uma das expressões, com base especialmente entre os meios estudantis, está na formação de coletivos identitários influenciados pelo pós-modernismo .

Com forte caráter anticomunista, latente ou declarado, estes segmentos pós-modernos vêm disputando espaço com militantes marxistas. Todavia, é frequente por parte de pessoas influenciadas pelo pós-modernismo a fuga das críticas, alegando uma suposta banalização do conceito de «pós-modernismo» ou se ancorando num alegado dogmatismo por parte dos críticos que, dizem, chamariam de «pós-modernismo» qualquer coisa que fugisse da sua «ortodoxia sobre luta de classes» (sic). Então é necessário não só desmontar esse espantalho como ainda apontar, resumidamente, as principais críticas do marxismo ao pós-modernismo hoje. 

Mas por qual motivo classificar esse fenômeno como «pós-modernismo»?

Grosso modo pelo fato de partir de uma premissa cara aos seus primeiros formuladores: a suposta superação do que chamam de «modernidade». Para os pós-modernistas «puro sangue” a sociedade «moderna», do capitalismo industrial e baseada nos valores oriundos do iluminismo, teria sofrido profundas mudanças qualitativas e quantitativas que teriam levado a modernidade à superação – logo, viveríamos numa «era pós-moderna».

Assim, quando se aponta que alguém é «pós-moderno» (e, talvez fosse mais correto chamá-lo de «pós-modernista») está se falando em algo como «apologista do pós-modernismo»; ou seja, de alguém que, conscientemente ou não, abraça a ideia de superação da «modernidade» por essa tal nova sociedade «pós-moderna» e projeta-se politicamente com base nesse princípio.

Discordarmos dessa premissa – pois, ainda que com importantes mudanças, o modo de produção capitalista continua a manter suas principais caracterísicas, inclusive o conflito entre capital e trabalho como centro das contradições da sociedade moderna capitalista .

Todavia, é importante destacar que não é uma polêmica meramente nominalista. Não seria tão problemático (ainda que, dependendo da abordagem, continuasse a ser problema) dizer que as mudanças existentes no capitalismo marcariam uma transição profunda para «novos tempos».

O problema maior é a conclusão derivada: se a sociedade «moderna» estaria superada, os projetos políticos e ideológicos fundamentados na mesma também! Tais projetos seriam, basicamente, aqueles oriundos do iluminismo, baseados em noções como o uso da razão e da ciência como instrumento de compreensão da realidade, a busca por valores (como liberdade e igualdade) universalmente válidos, entre outros.

No campo de «ideologias modernas» supostamente superadas por se basearem numa «modernidade» não mais existente (alegam) estaria o marxismo. Portanto, os pós-modernos (ou pós-modernistas) incorrem em um anticomunismo distinto daquele conservador ou reacionário. Para eles a «modernidade» estaria superada – como se algo tivesse passado da validade. Não seria questão de negar sua edificação em prol de conservar algo antigo, mas de constatar sua superação. 

Apesar das primeiras grandes manifestações pós-modernistas serem, grosso modo, vistas massivamente nos anos 1960 e 1970, é com a queda da União Soviética em 1991 que o pós-modernismo tem grande difusão. Segundo os aspirantes a coveiros da História, a queda da URSS demonstraria que os projetos «modernos» estariam superados. A última esperança oriunda do iluminismo, o socialismo, teria, aí, uma pretensa prova da sua falência.  

A estética pós-moderna apresenta diferenças fundamentais em relação a tudo o que veio antes dela, incluindo todas as estéticas modernistas. Os próprios critérios-chave da estética moderna, do novo, da ruptura e da vanguarda são desconsiderados pelo Pós-Moderno. Já não é preciso inovar nem ser original, e a repetição de formas passadas é não apenas tolerada como encorajada. 

Em «Pós-modernismo, razão e religião», de 1992, Gellner refere-se ao pós-modernismo da seguinte forma:

«O pós-modernismo é um movimento contemporâneo. É forte e está na moda. E sobretudo, não é completamente claro o que diabo ele é. Na verdade, a claridade não se encontra entre os seus principais atributos. Ele não apenas falha em praticar a claridade mas em ocasiões até a repudia abertamente…«

A influência do movimento pode ser discernida na Antropologia, nos estudos literários, filosofia…

As noções de que tudo é um «texto», que o material básico de textos, sociedades e quase tudo é significado, que significados estão aí para serem descodificados ou «desconstruídos», que a noção de realidade objectiva é suspeita – tudo isto parece ser parte da atmosfera, ou nevoeiro, no qual o pós-modernismo floresce, ou que o pós-modernismo ajuda a espalhar.

O pós-modernismo parece ser claramente favorável ao relativismo, tanto quanto ele é capaz de claridade alguma, e hostil à ideia de uma verdade única, exclusiva, objectiva, externa ou transcendente. A verdade é ilusiva, polimorfa, íntima, subjectiva … e provavelmente algumas outras coisas também. Simples é que ela não é…

Tudo é significado e significado é tudo e a hermenêutica o seu profeta. Qualquer coisa que seja, é feita pelo significado conferido a ela…«. 

O pós-modernidade está em fase de passagem, e não de crescimento, na organização social.

Por conta da dificuldade encontrada pelos pós-modernos no que concerne à defesa de seus absurdos, é cotidiano que se esquivem do debate ao bradarem acusações de que todos os críticos seriam conservadores ou pessoas interessadas na manutenção de “opressões” – o que vem gerando, inclusive, episódios de agressão (aberta ou não – como campanhas caluniosas contra mulheres e homens comunistas). Entretanto, basta uma breve consulta bibliográfica para constatar o contrário.

Grandes nomes progressistas das ciências humanas e sociais, brasileiras e internacionais, como Ellen Wood e Ciro Flamarion Cardoso, possuem vasta obra de críticas que vão dos fundamentos epistemológicos até os movimentos sociais/seitas pós-modernistas.

Logo, combater o pós-modernismo é tarefa de qualquer um que acredite que existe uma realidade objetiva que não só pode ser compreendida através da razão e da ciência, como também transformada e melhorada a partir dos resultados dessa compreensão – especialmente da parte da militância marxista.

Afinal, o pós-modernismo é, como foi comentado, inerentemente anticomunista nos fundamentos epistemológicos e nas ações propostas.

O que está em jogo não é a defesa ou não das lutas e dos movimentos de “minorias”, mas sim a forma de fazê-la.

Enquanto marxistas propõe, de um lado, fazê-la a partir da integração dos setores progressistas da sociedade sob um programa de caráter emancipatório universal baseado no acúmulo do conhecimento geral de toda a humanidade e na análise científica da sociedade.

Pós-modernos reduzem-na a seitas identitárias que tomam como dever apenas a luta da própria “minoria” (e que frequentemente entram em contendas entre si para disputar o lugar de “oprimido por excelência”), abrindo mão do conhecimento humano acumulado e da ciência em prol da abordagem apenas moral da opressão, incorrendo, por vezes, na própria oxigenação com base na manutenção do mero ódio contra aqueles que não compartilham diretamente da mesma opressão, levando a um modus operandi que não raro flerta com as práticas do fascismo clássico.

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